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Artesania poética

janeiro 7, 2019

Um leitor é um leitor, e basta. Seja lendo um inocente gibi ou as grandes sagas clássicas da humanidade, algo indescritível acontece quando alguém volta seus olhos para uma série de palavras postas em ordem querendo dizer algo. Nesse jogo, cujos movimentos do autor já foram dados e estão à espera dos lances do leitor, a literatura se tece. Cada um possui o seu livro, o seu texto, como aquele que foi o inicial, ou então o que criou uma situação singular, de modo que todo o universo tornou-se harmonia única canalizada naquele que lia.

Não importa o que se lê, o que importa é que se leia. E que seja um contínuo desafio de descobrir novas coisas e novas perspectivas sobre o já visto. Nesse sentido, um poema que consegue sintetizar a dupla ação presente no ato da leitura é “Artesania poética”, de Eduíno de Jesus, poeta açoriano.

Sem mais, vamos a ele:

ARTESANIA[1] POÉTICA

(Eduíno de Jesus)

 

Macerar[2] as palavras

Até fazerem sentido.

Depois macerar o sentido

Até fazer palavras.

 

E depois macerar as palavras

Até fazerem outra vez sentido.

E depois macerar o sentido

Até fazer outra vez palavras.

 

E depois macerar

Outra vez as palavras.

E depois macerar

Outra vez o sentido.

 

… até ficar sem palavras

… até perder os sentidos.

 

—

[1] trabalho artesanal; [2] amassar, quebrar, transformar

***

 

O título já demonstra que se vai apresentar como se dá o trabalho de criação poética. E a primeira estrofe, repetida com suaves alterações na segunda e na terceira, contrapõe dois processos principais que se intercalam e sucedem: tornar as palavras em sentido, tornar o sentido em palavras. Assim, o poeta (ampliando aqui para o leitor, o professor, o aluno, todo aquele que lê algo e dali extrai um sentido) pratica a ação de compreender algo, mas, para que não fique restrito à sua cabeça, tem de comunicar aos outros. Eis que surgem as palavras, para que os outros tenham acesso ao mesmo caminho de raciocínio que o poeta teve.

É um percurso complexo, pois as palavras são muitas (como já apresentado no primeiro texto publicado nesse site, disponível aqui) e os entendimentos são infinitos. Mas cabe ao poeta não desanimar, assim como o leitor, e seguir nessa via de transformação, extraindo sentidos das palavras e comunicando esses sentidos descobertos aos demais, na forma de outras palavras.

E a beleza da poesia (e o grande achado do poema) está, precisamente, no jogo de ambiguidades que os versos finais apontam: de tanto macerarmos palavras e sentidos, podemos perder esses materiais, mas, ao mesmo tempo, os resultados a que chegamos podem ser tão estonteantes e reveladores do mundo e de nós mesmos, que ficamos mudos (“sem palavras”) e deslumbrados (“perdendo os sentidos”).

A função da literatura é deslocar, propor desvios e caminhos ao leitor. A função do leitor é compreender a proposta do autor e do texto, compactuar com ela ou rebelar-se. De qualquer forma, quanto mais se lê, mais se ampliam os horizontes e mais se conectam associações e visões múltiplas.

É preciso que se incite a curiosidade de saber o que e o porquê se escreve.

É preciso que se desvendem os sentidos que se insinuam, pela leitura.

É preciso que se leia.

Feliz Dia do Leitor!

 

E pronto, até o próximo texto!

por Saulo Gomes Thimóteo

AçoresEduíno de Jesusmetalinguagempoemaséculo XX
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Literatura portuguesa

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